Textos em português e esperanto. Tekstoj en la portugala kaj en Esperanto.

Obrigada por sua visita! Dankon pro via vizito!

sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Festival _ Festivalo



Festival

O ano se despede 
da poesia em férias, 
mas deixou para mim 
um mistério que me basta:

o brilho líquido
desse mar intenso 
que cabe inteiro 
nos meus olhos.

Festivalo

La jaro adiauas
Poezion, kiu ferias, 
sed lasis al mi 
iun misteron,
kiu sufichas:

la likvan brilon 
de tiu intensa maro,
kiun la okuloj
tute enhavas.

Maria Nazaré Laroca
Cabo Frio, 30/12/2016.







quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Por enquanto _ Provizore



Por enquanto


Gosto de ler  poesia na praia; 
abro  um livro por dia,
 e liberto os poemas
que voam céleres para a água.

Então me dou conta
 da poética contemporânea 
hermética 
que decreta a morte
da transparência semântica:

Poesia não mais encanta,
decanta o cotidiano,
rasgando as entranhas óbvias 
das metáforas ingênuas.

Quem lê é malabarista
que  vence a luta
contra a astúcia 
da mimese oblíqua.

Mas de repente eis
a urgência de editar 
o oceano (que ora vejo!),
escavando as ondas
até encontrar a poeira
dos desertos que sangram
nas telas das tevês...

Poesia, então, para quê?
É melhor aprender a cozinhar
(pelo menos por enquanto !)

Provizore

Mi shatas legi poezion surstrande,
malfermante po unu libro chiutage, 
mi liberigas poemojn,
kiuj tuj flugas en akvon.

Kaj do mi ekrimarkas
la hermetikan nuntempan poetikon,
kiu dekretas la morton
de l’ semantika travideblo:

Poezio ne plu ravas,
ghi elpurigas la chiutagan vivon,
disshirante la evidentajn internajhojn
de l’ metaforoj naivaj.

Leganto estas jhonglisto,
kiu  venkas la lukton 
kontrau la ruzeco
de l’ oblikva "mimesis".

Sed tuj mi eksentas
la  urghon fasoni oceanon
(kiun nun mi vidas!)
fosante l’ondojn
ghis trovi la polvon
de l’ dezertoj sangantaj
sur l’ekranoj de l’  TV-oj...

Chu poezio do por kio?
Des pli bone eklerni la kuirarton!
(Almenau  portempe!)

Maria Nazaré Laroca
Cabo Frio, 29/12/2016.



terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Fim de ano _ Jarfino




Fim de ano

Automóveis
devoram a serra
rumo ao litoral,
onde a vida fica
entre parênteses.

Apesar da brisa
que desarruma
a luz desta manhã
costurada de azul,
dezembro ainda
se espanta 
com retalhos 
de memória.

E a história
se repete
sem concessões.

Jarfino

La montaron
automobiloj formanghas
survoje al marbordo,
kie vivo kushas
parenteze. 

Malgrau la brizo,
kiu malfaras la lumon
de chi tiu mateno
kudrita en bluo,
ankorau miras
Decembro
pro eroj da memoro.

Kaj ripetighas
la historio
sen koncedoj.

Maria Nazaré Laroca
Cabo Frio, 27/12/2016.

domingo, 11 de dezembro de 2016

Pausa _ Paŭzo


Pausa

Neste santuário,
por um tempo,
fecho a janela
ruidosa do mundo.

Um silêncio verde
rege o trinado
de pássaros afinados.

Árvores muitas
ensaiam com graça
um balé invisível.

No açude brincam
famílias de patos;
e peixes desafiam
pescadores inábeis.

No pasto, vacas,
bois, cavalos,
simplesmente
existem.

E eu, então,
sou paz apenas,
sorvendo a liberdade
que não cabe neste poema.

Maria Nazaré Laroca
Hotel-fazenda Pousada Canário da Terra (Rio Novo).
Em 10/12/2016.

Paŭzo

En ĉi tiu sanktejo
dum kelka tempo
mi fermas la bruan
fenestron de l’ mondo.

Verda silento
direktas la trilon
de agordaj birdoj.

Arboj multaj
gracie preparas
nevideblan
baleton.

Ĉe lago ludas
familioj de anasoj,
kaj fiŝoj defias
mallertajn fiŝkaptistojn.

En  paŝtejo, bovinoj,
bovoj kaj  ĉevaloj,
simple ekzistas.

Kaj do mi fariĝas paco,
trinkante la liberon,
kiu transpasas
ĉi tiun poemon.

Bienhotelo Kanario el grundo (Nova Rivero).




terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Rumo _ Direkto



Rumo

O poeta carrega consigo
o peso de dezembros
que não passam, dezenas
de pássaros esquecidos.

Mas começa agora
a retirar dos ombros,
com  cuidado, o feixe
de sonhos ressequidos,
para arrojá-los sem pena
na chama da alma desperta.

Nos olhos, leva apenas
a  leveza da alegria,
pois o futuro descansa
nas águas da esperança.


Direkto

La poeto kunportas
la pezon  de decembroj,
kiuj ne pasas,  dekojn
da forgesitaj birdoj.

Sed nun li komencas
el la la ŝultroj eltiri  zorge  
la faskon  da velkintaj revoj,
por ilin forĵeti  senpene
en la flamon de l’ anim’ vekita.

En la okuloj, li nur portas
la leĝeron de l’ ĝojo,
ĉar l’ estonto ripozas
sur l’ akvo de l’ espero .

Maria Nazaré Laroca

Juiz de Fora, 06/12/2016.

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Aleppo





http://www.tvi24.iol.pt/videos/internacional/menina-siria-mostra-o-que-esta-a-acontecer-em-alepo/57f4c6060cf2e48931e66fe9




Aleppo

Nem Alice, nem Dorothy:
uma menina síria de sete anos
caminha entre os escombros
de uma cidade sob as cinzas
de cotidianos bombardeios.
O amanhã já veio, e ela não sabe.


Aleppo

Nek Alico, nek Dorothy:
siria sepjaraĝa knabino
piediras inter la ruinoj
de subcindra urbo
pro ĉiutagaj bombadoj.
Jam venis morgaŭo,
kaj ŝi ne ekscias.

Maria Nazaré Laroca
Juiz de Fora, 23/11/2016

sábado, 12 de novembro de 2016

Rascunho _ Malneto




Rascunho


Nas franjas do cotidiano,

coleciono instantes

tecidos de eternidade...

Agora é a voz 

raivosa da chuva

que roubou a noite

deste sábado  de novembro  

como tantos outros,

solitários sempre.




Malneto


En la franĝoj de l’ ĉiutagaĵo,

mi kolektas momentojn

teksitajn el eterneco...

Jen la voĉo nuna

de l’ pluvo kolera,

kiu ŝtelis la nokton

de l’ novembra sabato,

kiel tiom da aliaj,

por ĉiam solecaj.




Maria Nazaré Laroca

Juiz de Fora, 12/11/2016.

domingo, 6 de novembro de 2016

Perda _ Perdo



Perda

Houve um tempo
em que eu queria
silenciar todas as flores,
desligar os passarinhos, 
recolher o arco-íris, 
apagar o sol 
e enrolar o dia
como um tapete gasto.

           (1999)


Maria Nazaré Laroca

In: Poemas sem endereço. Juiz de Fora, MG. 2000.




Perdo


Estis tempo, 


kiam mi volis 


silentigi ĉiujn florojn, 

elŝalti la birdojn, 

kolekti la ĉielarkon, 

forviŝi la sunon, 

kaj volvi la tagon, 

kiel tapiŝon eluzitan.



Juiz de Fora, 06/11/2016.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

O lenheiro _ La lignovendisto



O lenheiro


O lenheiro do meu bairro
era um gigante negro
de pura emoção e músculos.

Invadia a minha rua
com o cheiro bruto da lenha
que trazia nas costas
como um brinquedo.

Nos olhos da meninada
um prazer esquisito,
ao vê-lo passar inteiro
como um deus africano.

Eta, lenheiro, amigo,
que  trago guardado
no fundo da minha infância!
A sua ingenuidade
até hoje me comove!


Maria Nazaré Laroca In: Sem cerimônia (Poesia). Juiz de Fora, MG. 1985. / 2ª edição 2000.


La lignovendisto  

La lignovendisto  de mia kvartalo
estis giganto nigra
el pura emoci’ kaj muskoloj.

Li invadis mian straton
per kruda odoro de l’ ligno,
kiun li alportis dorse
kiel ludilon.

En la okuloj de l’ knabaro
stranga plezuro, tiam
kiam li marŝis impone
kiel afrika dio.

Ha, lignovendisto, amiko,
kiun mi gardas
en la fono de mia infanaĝo!
Min kortuŝas via naivo
ĝis hodiaŭ!


Juiz de Fora, 02/11/2016.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Lua do Leblon _ Luno de Leblono



Lua do Leblon


Muitas luas já vivi ...

Lua barroca de Minas,

hóstia de luz elevada

sobre o silêncio beato

dos telhados das igrejas

de Ouro Preto e Mariana ...


E a lua fria de Manhattan

vai pingando solidão

nos braços da Liberdade ...


Mas essa lua vermelha

que contemplo de joelhos

do Mirante do Leblon:


lua vestida de ouro,

nua, despida em fogo,

paixão suspensa, fetiche ...


Essa lua equilibrista,

balão chinês que enfeitiça,

é como um orgasmo do sol:

incêndio num mar dourado!

Maria Nazaré de C. Laroca

(IN: Travessia do Poema. Juiz de Fora: FUNALFA; Campinas: Pontes Editores. 2012, p. 47.)


Luno de Leblono

Multajn lunojn mi travivis...
Baroka luno ĉe Minoj,
levita hostio  luma
super la silento pia
de l’ tegmentoj de l’ preĝejoj
en Ouro Preto, Mariana ...

Kaj  frida  luno de Manhatan
solecon estas verŝanta  
sur  brakojn de l’ Libereco ...

Sed ĉi tiu ruĝa luno, kiun,   
de l’ Leblono Belvidejo,
mi kontemplas surgenue:
 
luno per oro kovrita,
nuda, tutnuda fajre,
levita pasio, fetiĉo...

Tia luno, ekvilibristo,
ĉina balono sorĉanta,
estas, kiel sunorgasmo:
fajro sur ora maro!

Maria Nazaré Laroca
Poemo tradukita la 17-an de Oktobro 2016.
Juiz de Fora – Minoj - Brazilo

sábado, 15 de outubro de 2016

Requinte _ Fajneco





Requinte

Rósea plumagem
cintila na praça;
penugem da primavera:
ímpar delicadeza
do divino Pintor.


Fajneco

Rozkolora plumaro
trembrilas sur la placo;
plumiĝas printempo:
fajna delikateco
de dia Pentristo.

Maria Nazaré Laroca

Juiz de fora, 15/10/2016.

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Adeus, Zequinha!



A José Furtado Pereira
In memoriam

O Poeta Zequinha, tão douto e tão simples, morava no sítio Shangri-la, em Guarani.

Nas nossas reuniões da AJL, eu lhe dizia sempre, quero ir lá, um dia, conhecer o seu paraíso particular... E o amigo sorria hospitaleiro... 
Mas o tempo engoliu os nossos dias... E o Poeta foi embora, para viver para sempre na Shangri-la do Céu... 
Lá, o nosso querido amigo vai continuar o ofício de declamar poemas com alegre sabedoria! E a turma que já se foi recebe-o agora com aplausos de saudade. São Pedro também gosta de poesia!

Vamos sentir sua falta, Zequinha!

Maria Nazaré Laroca 

Juiz de Fora, 12/10/2016.

.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Movimento _ Movimento



Movimento

Três dias chovendo a cântaros, e eu preocupada com o sumiço da primavera.
O vento gelado silenciou os pássaros e o perfume das flores da praça.
Pela vidraça, a cidade diluída em cinza e impaciência.
Três dias embrulhada em poesia, café e jazz. Às vezes aumentava o volume da música para abafar o ronco mal-educado dos trovões.
Mas hoje, precisamente às quatro da tarde, aconteceu um milagre: jogaram uma tinta azul brilhante no céu, e o sorriso ainda molhado do sol resgatou a primavera  que tremia de frio nos porões do inverno.
E então a vida voltou à vida.


  
Movimento

Tri tagojn torente pluvadas, kaj jen mi maltrankvila pro la malapero de printempo.
La glacia vento silentigis la birdojn kaj la parfumon  de la floroj de la placo.
Trans la fenestro, la diluita urbo grizas kaj malpaciencas.
Tri tagojn volvita en poezio, kafo kaj ĵazo. Kelkfoje mi plialtigis la sonon de la muziko por dampi la malĝentilajn tondromuĝojn.
Sed hodiaŭ, precize je la kvara horo posttagmeze, miraklo okazis: oni ĵetis brilan bluan farbon sur la ĉielon, kaj la ankoraŭ malseka rideto de la suno liberigis printempon, kiu tremis de frosto en vintra kelo.
Kaj tiam la vivo revenis al vivo.

Maria Nazaré Laroca
Juiz de Fora, 05/10/2016

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Tormento _ Turmento



Tormento

Da fonte latina invidia -
ver errado, a inveja
é cega pelo cultivo
da  falta de autoamor.

O invejoso odeia
a felicidade alheia;
o seu olhar naufraga
nos frios labirintos
de si mesmo.

Na Divina Comédia
e na tragédia da vida,
ao  invejoso o martírio
dos olhos costurados:
não poder ver a luz.

  
Turmento

El latina fonto: invidia -
mise vidi - envio
blindas pro kultivo
de manko de memamo.

Enviulo malamas
alies feliĉon;
lia rigardo dronas
en siaj malvarmaj
labirintoj mem.

En la Dia Komedio
kaj ĉe l’  tragedio de l’ vivo
al enviulo la martiriĝo
pro kudritaj okuloj:
ili ne rajtas vidi lumon.

Maria Nazaré Laroca

Juiz de fora, 29/09/2016.